sábado, 7 de março de 2015

A internacional do terror midiático

Texto de Aram Aharonian, jornalista e diretor da Telesur, publicado no Carta Maior:


Hoje, todas as luzes de alarme permanecem acesas no norte e no sul diante das intenções restauradoras da velha ordem neoliberal. As forças mais reacionárias do mundo intensificaram suas campanhas para desestabilizar novamente vários governos latino-americanos – o venezuelano, no social, econômico e militar; o argentino, no financeiro, por exemplo, em uma experiência que pode ser aplicada a qualquer outro país latino-americano cujos recursos naturais interessem às potências centrais.

A crescente e orgânica participação dos meios de comunicação cartelizados – nacionais e estrangeiros – na preparação e no desenvolvimento das guerras e planos desestabilizadores promovidos por e dos Estados Unidos demonstra que estes se transformaram em verdadeiras unidades militares. Se há 40 anos era necessária a ação das forças armadas para impor seu projeto, hoje o cenário de guerra é simbólico e taques e baionetas não fazem falta: basta o controle dos meios hegemônicos para impor modelos políticos, econômicos e sociais.

A guerra se transfere ao espaço simbólico, à batalha ideológica, à guerra cultural e, portanto, as armas para essa nova confrontação são diferentes. Já não são metralhadoras, mas microfones, computadores, telefones, câmeras de vídeo... A guerra para impor imaginários coletivos se dá através de meios cibernéticos, audiovisuais e gráficos.

Os meios comerciais de comunicação confiscaram a liberdade de expressão e, precisamente, aprisionaram-na para usá-la como refém. Diante desse poder, os indivíduos não valemos nada. Os meios se tornaram despóticos e impiedosos, como nunca qualquer reizinho ou ditadorzinho já foi. Uma vez que acusam e condenam, não há como apelar a ninguém.

O terror midiático


A arte da desinformação foi um elemento chave em todos os conflitos bélicos desde a Antiguidade. Falamos de três mil anos: já naquela época, não se tratava de escrever a realidade dos fatos, a história verdadeira, mas de confrontar percepções, imaginários coletivos da sociedade a favor, é claro, da cultura dominante, dos poderes fáticos, incluindo – em tempos mais recentes, por volta do século XVII – as diversas igrejas.

É claro que as agências internacionais de notícias surgiram para afiançar o poder colonial das potências europeias, sobretudo na África e na Ásia, e também é claro que cada vez que surge um conflito, a imprensa do sistema é a encarregada de silenciar qualquer opinião independente, eliminar o debate e o desentendimento, para orquestrar as respostas emocionais em massa a seus interesses.

Já em 1982, os britânicos haviam aplicado a férrea censura de imprensa e a verdade oficial durante o conflito com a Argentina no Atlântico Sul, experiência que serviu para sua aplicação posterior em Granada, na Somália, no Iraque, no Afeganistão e em muitas outras regiões. Hoje, a frente da direita latino-americana e mundial – incluindo o governo dos Estados Unidos, alguns de seus aliados incondicionais da região e outros da União Europeia – assumiu protagonismo ativo desde fevereiro de 2014 em seus ataques midiáticos contra a Revolução Bolivariana e os governos de Argentina e – em breve – Brasil.

As três redes privadas mais importantes de jornais da América Latina se uniram para “difundir informações (leia-se manipulações, distorções, mentiras, difamações) sobre a situação na Venezuela”. Internamente, as campanhas de imprensa querem provocar cansaço nos cidadãos, e semear no exterior um imaginário coletivo de repressão, autoritarismo, uma sensação de caos e ingovernabilidade.

A Argentina enfrentou em 2014 uma extorsão financeira sem precedentes. Os especuladores que compraram títulos da dívida por 48 milhões de dólares conseguiram em Nova York uma sentença de retorno por 500 milhões. Essa fraude retrata como funciona o capitalismo atual, sistema que empurra nossos países mais e mais ao padecimento. Os abutres repetem a mesma coisa que já fizeram em outros lugares, como o Peru, e ameaçam toda a região.

Ainda que o cenário afete especificamente a Argentina, ele deixa qualquer dívida soberana sob a garra dessas pessoas. Em 2014, a dívida representava 104% do Produto Interno Bruto nos EUA, 93% na Espanha, 132% na Itália, 129% em Portugal, 78% na Alemanha, 175% na Grécia, 123% na Irlanda e 90% no Reino Unido.

O precedente dessa decisão judicial vai muito além do prejuízo contra a Argentina e coloca em risco qualquer reestruturação futura da dívida... com o olhar direcionado à periferia europeia.

Paralelamente, no Brasil, desatou-se uma furiosa ofensiva midiática contra a estatal petroleira Petrobras, apoiando as demandas do fundo abutre Aurelius. Existe, sem dúvida, uma intenção de provocar um descalabro financeiro na região, com apoio de setores internos, que colaboram com esses interesses sem questionar suas “práticas mafiosas”. Existe uma estratégia mais generalizada que está utilizando a questão financeira como campo de batalha contra determinados processos políticos. Em 2014, levaram a Argentina ao default e atacam o Brasil. É uma guerra sem armas, ocorrendo no terreno judicial e com objetivos políticos.

Ninguém estranhou o fato de os meios hegemônicos argentinos terem manejado a informação e a opinião para se alinhar à posição dos credores, denegrindo e ridicularizando a posição de seu país e minimizando a informação sobre os apoios solidários recebidos de todos os países latino-americanos e caribenhos, do Grupo dos 77 (mais de 120 países e desenvolvimento, mais a China), e dos Brics, entre outros.

A aposta das transacionais e dos fundos abutres, referendada de modo cartelizado pelos grupos midiáticos hegemônicos em nível regional, internacional e interno, foi a de criar tumulto na população diante de uma “iminente” corrida bancária e cambial, diante do embargo de ativos petroleiros nacionalizados. E a cartilha se repete na Venezuela, na Argentina e no Brasil.

Nos nossos tempos, marcados pelo neoliberalismo, vícios como a cobiça e o individualismo se transformaram em virtudes, exaltadas por Hollywood por meio da homogeneização dos meios de comunicação.

Devemos lembrar que o conceito de terrorismo midiático está relacionado a um emaranhado de estratégias políticas, econômicas, sociais e psicológicas que buscam criar realidades fictícias, medos coletivos e transformar mentiras em verdades que permitem manipular a sociedade de acordo com o conflito ou com o inimigo em questão.

Se partimos da ideia de que, para o poder, qualquer sujeito considerado uma ameaça a seus interesses é concebido como inimigo de guerra, então o terrorismo midiático parte do fato de que a guerra psicológica utiliza uma caracterização simplista e maniqueísta (bom/mau, negro/branco) para descrever o inimigo. A chamada propaganda negra não é outra coisa senão a construção de alguns nomes, alguns relatos, algumas categorias, algumas imagens que ordenam os acontecimentos a partir de um eixo de destruição do outro. Esse processo é feito ocultando a verdade, e sobretudo mentindo acerca dela, conforme observa Florencia Saintout, da Universidade argentina de La Plata.
 
Mas a resposta – dos governos atacados – a essas matrizes terroristas midiáticas foi reativa e não proativa, propositiva, informativa. Foi baseada em denúncias (o que é próprio de uma etapa de resistência, e não de construção) e na preocupação pela solidariedade passiva. Na Venezuela, foram mensagens inundadas por consignas, inserções, mensagens solidárias (que ninguém lê e outros, no norte, arquivam em suas bases de dados), lamentos, imobilidade.
 
A falta de fontes de informação verdadeira, oportuna e para todos facilita o trabalho da direita de impor imaginários coletivos através de uma imprensa – rádios, meios cibernéticos fixos e móveis, televisões, jornais, revistas – totalmente cartelizada atrás da mensagem única, produzida pelas usinas no exterior e em cada um de nossos países.


Tradução de Daniela Cambaúva

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