sexta-feira, 25 de maio de 2012

O novo pensamento autoritário

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas e no Tribuna do Agreste:


O recente artigo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sobre livro do sociólogo francês Alain Touraine é um sinal de novas tendências no campo doutrinário do chamado novo liberalismo.

Ao lançarem as bases do que propõem como paradigmas da política e da moral pública, FHC e Touraine indicam os caminhos que o pensamento hegemônico da nova ordem mundial deve tomar e as premissas ideológicas hasteadas pelo capital financeiro internacional.

Fernando Henrique afirma em primeiro lugar que daqui para frente o confronto central da civilização será entre o mundo do lucro e a defesa dos direitos humanos, do individualismo com responsabilidade social.

Mas isso aponta para a tentativa de se rebaixar, teoricamente, ou esconder os fatores econômicos nos destinos das sociedades e dos indivíduos.

O ex-presidente-sociólogo argumenta que os partidos políticos teriam perdido a sua lógica e razão de existir e deveriam ser substituídos por outras formas de organização que seriam consagradas por uma suposta Nova Era das sociedades onde os conceitos da "pós-política" e da "pós-economia" devem conduzir o futuro da humanidade.

É importante frisar que essas ideias não são originais tanto no âmbito da História quanto no pensamento político e estão em moda nesses últimos vinte anos via complexo midiático hegemônico internacional como propaganda ideológica de desestímulo à participação popular nos destinos políticos das nações.

Que também promove intensamente o engajamento das pessoas em causas fragmentárias, tópicas, atomizadas, especialmente através das ONGs, que são em última instância um sub-produto do neoliberalismo, cujas origem e essência residem na ideia da fragilização do caráter estratégico do Estado nacional.

O que aparece na verdade como novo é a negação explícita à existência dos partidos políticos, além da tentativa de criminalização da ciência econômica como instrumento fundamental para compreensão dos mecanismos das sociedades e por conseguinte dos caminhos para a sua transformação.

Assim é que surge agora a apologia de uma espécie de Nova Inquisição contra o pensamento científico. E com a falência generalizada da nova ordem mundial, das agremiações neoliberais ortodoxas mundo afora, já se pensa abertamente em doutrinas que justifiquem o retorno dos regimes autoritários como freio ao crescimento das nações e às lutas dos povos.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Sinal vermelho

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas e no Tribuna do Agreste:


A débâcle, nessa semana, de vários grandes bancos espanhóis acelera a crise financeira do país sacudido por imensas manifestações de trabalhadores, estudantes, pequenos, médios empresários, que se espalham de Madri à Catalunha.

Na verdade a Europa caminha a passos largos rumo a um sério impasse econômico, social, com desdobramentos políticos que já se manifestaram nas eleições francesa, grega e recentemente na Alemanha.

Mas o que está em cheque mesmo é a atual configuração da União Europeia e a suposição de que suas políticas fiscais são equânimes para todos os seus membros.

O que é uma verdadeira falácia porque essa pretensa igualdade nos direitos e deveres de cada nação associada ao Euro revelou-se na prática uma equação de dominação por parte das duas grandes potências econômicas, Alemanha e França, associada a uma profunda subordinação das demais sejam elas médias ou pequenas.

Ao insistir na estratégia da austeridade fiscal em detrimento das políticas de retomada do crescimento contra a crise, o governo Merkel secundado pela França do então presidente Sarkozy, ajudou a empurrar a Europa para o abismo, resultante das relações servis do Banco Central Europeu para com as poderosas instituições financeiras do velho continente.

O que se encontra em curso por lá é a aplicação do mesmo veneno que vitimou a América Latina e o Brasil, provocando a estagnação econômica, verticalizando os históricos abismos sociais existentes, sustando o crescimento por décadas.

Os desdobramentos da atual situação crítica que passa a Europa serão observados e medidos em questão de meses, tal é a sua gravidade. Deverá mergulhar no caos inicialmente Grécia, Portugal, Espanha, Itália, com grandes possibilidades, em cenário mais agudo, de por em cheque a existência do Euro.

O que pode suscitar uma nova onda de abalo na economia mundial já em crise desde 2008 com a explosão da "bolha imobiliária" nos Estados Unidos quando os governos Bush e Obama livraram a cara dos banqueiros e massacraram a população norte-americana.

Assim, o Brasil precisa ficar atento ao sinal vermelho que acendeu na economia mundial. O governo necessita intensificar novas estratégias de crescimento econômico, blindar o País contra as tentativas de assalto do capital especulativo e mover-se com cuidado em uma crise política global poucas vezes vista.

Quem nos salvará dos super-heróis?

Na revista Carta Capital, "Blog do Eisenstein", de Vitor Knijnik, em seus “Blogs do Além”:



Nos seus primeiros anos de vida, logo após os irmãos Lumière o parirem, o cinema não passava de uma atração de feira e exposições. Ninguém via grande futuro naquela invenção. Porém, era uma curiosidade que fazia as pessoas literalmente caírem da cadeira. O olhar virgem da plateia não demandava que os protocineastas contassem histórias. Para causar sensação, bastava apenas registrar as coisas em movimento e depois exibir a película. Mais ou menos como são os filmes pornôs.

Mas o ser humano é um bicho enjoado e logo boceja quando não lhe apresentam novidades. Alguns pioneiros, então, decidiram contar histórias através do cinematógrafo para assim manter o interesse da audiência. Outros investiram no ramo da pipoca, apostando que no futuro ninguém conseguiria ficar duas horas sentado fazendo uma única coisa.

Uma das primeiras experiências narrativas relevantes aconteceu nos Estados Unidos, através das mãos de D.W Griffith. Ele introduziu novas formas de fazer cinema. Foi o primeiro a usar dramaticamente a montagem, alternando closes e movimentos de câmera. Por isso é conhecido como pai da linguagem cinematográfica. Da mãe sabe-se apenas que fugiu com um rico produtor de Hollywood.

Minha contribuição para a consolidação do cinema como expressão artística foi decisiva. Eu percebi que a montagem poderia ir além de uma mera ligação de imagens relacionadas. Acreditei que uma terceira ideia poderia ser gerada na cabeça do espectador com a justaposição de duas imagens independentes. Essas colisões de imagens permitiram manipular as emoções da audiência e libertaram a linguagem cinematográfica para a criação de metáforas, coisa que Stalin adorou.

Mas por que estou aqui a contar a história do cinema e a sublinhar minha importância? Ora, a intenção é justamente contrária. Sinto-me derrotado ao ver que o meu legado foi transformado. Imaginei que, com minhas descobertas, as narrativas se sofisticariam e a linguagem cinematográfica se expandiria sem limites. Nada disso. O cinema se desinteressou pelo mundo adulto. Virou uma indústria dedicada apenas a adular adolescentes ou a infantilizar os maiores. Veja o que está em cartaz neste momento (não importa qual). Cerca de 70% das salas estão tomadas por personagens que precisam salvar o mundo de uma grande ameaça. Das 30 maiores bilheterias de todos os tempos, 28 são dedicadas aos menores de 18 anos. Isso se você considerar que Avatar e Titanic têm temática adulta.

Há os que alegam que os filmes não precisam ser mais do que divertimento. Pode até ser. Mas, da mesma maneira que as primeiras plateias exigiram ver mais do que movimentos, as atuais pedem cada vez mais adrenalina. E os estúdios respondem fazendo filmes caricatos que se parecem com uma montanha-russa, só que sem aquela parte tranquila da primeira subida. As montagens estão tão frenéticas que, numa cena de luta ou perseguição, não sabemos quem é quem. Só sabemos que o herói vai sobreviver. É por isso que o balde de pipoca não para de aumentar.

Me despeço coerente com meus princípios. Deixo aqui três frases. Monte-as como quiser:

Heróis assassinos.

O cinema morreu.

Socorro, o 3D quer furar meu olho.

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Um mundo melhor

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas e no Tribuna do Agreste:


Durante o século XX muitos das gerações que sucederam umas às outras tinham como pressuposto ético de vida pensar o mundo para melhor. Uns lutavam por transformações econômicas, sociais, radicais, outros desejavam reformá-lo, vários pensavam que ele já estava de boa medida, tratava-se apenas de ajustá-lo no que fosse possível.

Em uma visão simplista poderíamos definir essas tendências como revolucionárias, reformistas ou conservadoras, apesar do surgimento de fenômenos como o nazi-fascismo, durante os anos vinte aos quarenta, subproduto dos conflitos pela hegemonia capitalista-imperialista, ensejando a Segunda Guerra Mundial.

Mas no geral os confrontos políticos, filosóficos, ideológicos, teológicos, giravam sempre sobre a questão: como poderia ser esse mundo menos injusto, qual a maneira para aperfeiçoá-lo ou transformá-lo ?

No final do século vinte, com a débâcle do campo socialista ocidental, especialmente a URSS e o leste da Europa, pari passu ao movimento de centralização, concentração do capital financeiro mundial em escala mais agressiva, acontece uma inflexão profunda na geopolítica, na economia, nos conceitos gerais das sociedades como decorrência desse processo.

Pensadores marxistas definiram esse período da História surgido ao final do século como um "tempo inicial de sombras e trevas" que transcendia o aspecto da luta pela emancipação dos trabalhadores, estendia-se ao conjunto da atividade humana em todos os seus aspectos.

A vida mostrou que se tinha razão, nasce o pensamento único hegemônico imposto à base de um paradoxo, uma sociedade totalitária governada sob regras discricionárias, combinada com um individualismo sem fronteiras como princípio e fim da vida moral.

Entroniza-se assim outro conceito para as gerações, já não se trata de construir um mundo melhor como espírito ético da civilização, mas como, nessa ânsia hedonista infinita, o indivíduo realiza o melhor dos mundos para si próprio.

E se há novas vocações políticas, então que elas se realizem através de uma agenda social global unificada, pré-definida, nos marcos do sistema.

Mas as contradições estruturais do capital reaparecem em meio à brutal crise demonstrando a face totalitária, a exaustão econômica, um enorme cansaço social à ordem e à ideologia "globalizada", indicando que a alternativa a esse modelo de sociedade é mesmo a luta por um mundo melhor.

domingo, 6 de maio de 2012

Aquecimento global: as previsões furadas de Lovelock

Texto de José Carlos Ruy, publicado no Vermelho:

E a Terra não esquentou...

James Lovelock é um dos gurus da tese segundo a qual o aquecimento global, provocado pelo homem, vai esturricar a Terra. Agora, diz que estava errado. Um erro de consequências políticas monumentais.

James Lovelock é um dos principais ideólogos do catastrofismo ambiental em nossos dias e um dos gurus do movimento ambientalista. Autor de inúmeros livros, formulador da hipótese Gaia, que vê a Terra como se fosse um enorme organismo, ele é um cientista influente que chegou a prever a morte de bilhões de pessoas devido às mudanças climáticas que, em sua opinião, iriam esturricar o planeta. Foi um dos formuladores da tese de que a mudança climática decorre da ação humana sobre o ambiente.

Ele chegou a propor, em 2004, que o que restasse da humanidade só conseguiria viver no Ártico, onde o clima continuaria “tolerável”. E pregava, na linha do mais radical ambientalismo, a necessidade de um “melhor uso dos recursos” da Terra e isto significava, desde as reuniões do Clube de Roma, em 1968, e da ONU em Estocolmo, 1972, a contenção do desenvolvimento da economia. Isto é, contenção do desenvolvimento econômico dos países pobres, para, usando palavras de Lovelock, “sustentar a civilização o máximo de tempo” possível. A palavra “civilização” esconde, nesta frase, aquilo que realmente seu autor quer dizer: os países ricos e o modo de produção capitalista.

Lovelock é, assim, um dos principais - se não o principal - defensores da tese de que o aquecimento global decorre da ação humana. Na verdade, era. Numa entrevista ao site da rede americana MSNBC, em 23 de abril passado, o cientista britânico, de 92 anos de idade, na qual renegou o catastrofismo climático e ambiental e admitiu que exagerou. Reconheceu, sem rodeios: "Tudo bem, cometi um erro."

Naquela entrevista ele disse que o comportamento do clima da Terra desde o ano 2000 contrariou suas previsões mais pessimistas; admitiu que os estudos a respeito são insuficientes, faltando mais pesquisas para entender o futuro do planeta. Reconheceu ter ido “longe demais na extrapolação” sobre o aquecimento global, quando deveria ter sido mais cauteloso. "O problema é que não sabemos como o clima atua, embora achássemos que sabíamos 20 anos atrás. Isso levou à publicação de livros alarmistas, inclusive os meus", disse.

Além de sua própria postura catastrofista, Lovelock acusa também o ex-vice-presidente americano Al Gore e seu filme "Uma Verdade Inconveniente" como exemplo do alarmismo ambientalista.

"O clima continua fazendo os seus truques de sempre. Não tem nada de muito emocionante acontecendo agora. Deveríamos estar a meio caminho de fritarmos", mas não é isso que está acontecendo, disse. Ele estranha o fato de que a temperatura global da Terra não tenha aumentado nos últimos doze anos, embora os níveis de gás carbônico (ou dióxido de carbono) na atmosfera, demonizado como o principal gás do efeito estufa, continuam subindo e batendo recordes. O aquecimento previsto para os doze anos seguintes a 2000 não ocorreu. "Doze anos é um tempo razoável”, e a temperatura tem permanecido constante.

Embora sem abrir mão da tese de que as emissões humanas de dióxido de carbono possam levar a um aumento global na temperatura, ele concorda agora que faltaram estudos a respeito do efeito dos oceanos sobre o clima. O oceano pode ter um papel fundamental, admite. "Ele poderia fazer toda a diferença entre uma idade quente e uma idade do gelo", disse.

Há uma pergunta no ar: foi um erro? Lovelock foi um dos principais formuladores do ambientalismo como ideologia, baseado num “santuarismo” paralisante do desenvolvimento particularmente de países pobres, entre eles a China, a Índia e o Brasil. Entre a ciência e a política, sua ação abandonou a primeira para reforçar o conservadorismo capitalista dominante e a defesa da manutenção da distribuição do poder político e econômico no mundo a favor das potências industriais capitalistas.

Ele foi um dos principais esteios da condenação dos cientistas que não aceitavam a tese dos adeptos da corrente principal do pensamento ambiental segundo a qual a mudança climática seria resultado da ação humana. E que tentaram desqualificar esses críticos impondo-lhes o rótulo de “céticos”.

O rolo compressor de um autointitulado “consenso científico” simplesmente desconsiderou as críticas científicas solidamente fundamentadas que recusavam as “verdades” dogmáticas deste verdadeiro evangelho do santuarismo ambientalista que é o relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o organismo da ONU dedicado ao problema) onde os questionamentos feitos pelos cientistas foram simplesmente ignorados. Lovelock foi um dos pilotos desse rolo compressor do conservadorismo ambientalista. Neste sentido, falar em “erro” pode ser simplório pois, na verdade, tratava-se de um dogma político que precisava ser impingido a países que defendiam seu direito ao desenvolvimento combinado com a defesa do meio ambiente. No mundo posterior à crise econômica de 2007/2008 e do rearranjo do quadro geopolítico internacional que veio na esteira dela, os dogmas do rolo compressor do aquecimento global simplesmente perderam o sentido e não colam mais. Qual será, agora, o próximo erro?

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Uma rara oportunidade

Meu artigo publicado na Gazeta de Alagoas, no Vermelho, na Tribuna do Sertão, no Almanaque Alagoas e no Tribuna do Agreste:


O primeiro de maio no mundo mostrou, pelas gigantescas manifestações acontecidas, a extensão e profundidade da crise do projeto neoliberal ortodoxo em vigência por quase todo o planeta, expõe os gargalos de natureza estrutural tanto do próprio sistema quanto desse modelo econômico imposto às sociedades pelo menos nos últimos vinte e cinco anos.

Um período caracterizado pela hegemonia absoluta do neoliberalismo que alcançou uma abrangência multilateral permeando os espaços da economia mas se estendeu também aos campos da cultura, comunicação, diplomacia, política, além do inquestionável predomínio militar.

Uma época em que foram mutilados vários princípios fundamentais da Carta das Nações Unidas, elaborada após a vitória dos aliados contra o nazi-fascismo.

E tem sido tamanha a força política, militar, do capital financeiro internacional e dos Estados Unidos, guardiões da nova ordem mundial, que essa Carta foi reescrita na prática, adequando-a aos novos movimentos de expansão, centralização do capital em nível global.

Produziu-se também um discurso teórico, ideológico cujo objetivo central tem sido a manutenção da supremacia absoluta das estratégias políticas e financeiras do capital, implementadas através dos organismos que compõem a nova ordem mundial onde o complexo midiático internacional hegemônico exerce papel determinante.

Esse centro de poder mundial, fenômeno que surgiu após a débâcle da URSS, sustentado militarmente, elaborou uma "nova agenda social" como falsa e fragmentada alternativa às fundamentais plataformas universais das lutas dos trabalhadores e nações, partindo da problematização de temas pertinentes e generosos, mas que passaram a ser ditados como a quinta-essência da chamada "questão social".     

Mas as consequências da atual crise sistêmica do capital repõem na ordem do dia, de maneira objetiva, as principais bandeiras de lutas relativas à emancipação dos povos, assim como o combate pela soberania nacional, como elementos incontornáveis ao progresso social de qualquer País.

O Brasil na contramão da crise global precisa adotar estratégias com vistas à construção de um projeto de nação (e de civilização) alternativos a esses impostos pela nova ordem mundial que se encontra visivelmente esgotada. Em um mundo que se encaminha para uma transição histórica, é uma rara oportunidade que não pode ser desperdiçada.